quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Notas para uma pedagogia visual bem humorada

  1. É natural que utilizemos obras de arte para o exercício de nossa desconfiança. Cultivar suspeitas pode nos salvar de verdades.
  2. Não se deixe enganar por tentativas de explicação de obras de arte; na maioria dos casos elas são desmentidas pelas próprias obras.
  3. Não confie na autonomia "soberana" das obras de arte, pois elas dependem do desconhecido que as tornou possíveis.
  4. Acredite nas dúvidas, especialmente naquelas sugeridas pelas obras; algumas delas são necessárias para a superação de nossas limitações.
  5. procure ver somente o necessário. A quantidade indiscriminada das coisa visíveis pode reduzir, em muito, a qualidade das experiências.
  6. Não espere ver o que esperava ver antes de conhecer. Só as obras de arte de qualidade duvidosa atendem a essa expectativa.
  7. Não confiem em artistas que parecem querer chamar sua atenção com artimanhas e "técnicas mirabolantes". estes bajuladores de público estão interessados apenas em mídia.
  8. Se um objeto artístico não parece ser arte, não o discrimine automaticamente. Só os falsificadores estão preocupados em fazer algo que se "pareça com arte". Artistas, por outro lado, fazem somente o que acreditam que deve ser feito.
  9. Considere sobretudo o "teor de evidência" de um objeto. Por mais completa que uma obra de arte possa parecer, ela será sempre insuficiente em relação àquilo que desconhecemos. Se for uma obra prima superará até mesmo o desconhecido.
  10. A espontaneidade não é um valor. É uma partida ou uma chegada. A simplicidade ou a complexidade ocorrerão apesar dela.
  11. Não pergunte o que os artistas querem dizer com as suas obras. Pergunte às obras. Ou encontre a satisfação nos riscos que estimulam sua curiosidade.
  12. A trancedência e o sorriso são invenções humanas. Um outro lado do ar é a contribuição dos artistas.
Waltércio Caldas

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Eras

Antes a gente falava: faz de conta que
este sapo é pedra.
E o sapo eras.
Faz de conta que o menino é um tatu.
E o menino eras um tatu.
A gente agora parou de fazer comunhão de
pessoas com bicho, de entes com coisas.
A gente hoje faz imagens.
Tipo assim:
Encostado na Porta da Tarde estava um
caramujo.
Estavas um caramujo – disse o menino.
Porque a Tarde é oca e não pode ter porta.
A porta eras.
Então é tudo faz de conta como antes?

(Barros, 2001.)

domingo, 31 de agosto de 2008

Na seção Falando em Brincar desse mês publicamos um artigo da professora Brasilda Rocha. Confira!"
O BRINKAR COMO TRANSFORMADOR DA ENERGIA
Brasilda Rocha
Consideramos o ato do brincar como forma de a criança adquirir novos conceitos, ampliar sua capacidade de criar e de observar, para que assim ela possa conquistar o sentimento de alegria e saúde mental no desenvolvimento das várias fases de sua vida adulta. Nosso objetivo científico é a comparação destas características com o brinquedo, determinando a fase da evolução psíquica em que a criança se encontra. Com estes dados podemos fazer a proposta operativa (uma evolução mais rápida e precisa) que leva ao processo terapêutico e, em termos profiláticos, atingir o desenvolvimento da personalidade da criança com maior eficácia. Estamos observando o ato do brincar como uma forma de aquisição de novos conceitos, ampliando a capacidade de criação e observação da criança, em relação ao desenvolvimento para a vida adulta e para conquistar seu sentimento de alegria e saúde mental. Identificamos a energia que diferentes brinquedos e brincadeiras contêm, e seus respectivos significados para a criança, procurando desta maneira descobrir e localizar esta energia em seu corpo.
O brincar reflete o corpo da criança e pode evoluir a partir das ações que dependem de influência e estímulo externos. Este brincar só terá significado quando seu simbolismo estiver inserido na realidade externa. Acreditamos que não seja possível ter uma idéia preconcebida de nenhum brinquedo, mas observamos que existem alguns que mobilizam determinadas energias, assim como outros que aparecem mais freqüentemente em determinadas fases do desenvolvimento da criança.
O brinquedo traz sua energia própria de saúde, sendo por isto capaz de proporcionar este equilíbrio energético, facilitando a relação com o organismo. Objetivamos levar a aprendizagem na exploração do brinquedo e descobrir seu significado no desenvolvimento da personalidade da criança. O brinquedo simboliza o corpo, e é utilizado como uma interpretação e/ou intervenção no processo psíquico e corporal. Nesta proposta, tratamos o brincar integrado ao processo natural energético, reequilibrando a carga e a descarga de tensões.
O terapeuta ou educador tem o papel de facilitador, no sentido de promover esta transfusão de energia através do brincar. Nosso objetivo final deve ser a estruturação e a reconstrução de defesas necessárias para um desenvolvimento adequado, e para que a criança utilize seu potencial afetivo. Nossa proposta de trabalho está norteada por pressupostos reichianos, baseando-se no conceito da fórmula da vida, associados a conceitos simbólicos e significados dos brinquedos, para que o profissional possa ter um papel ativo diante da criança, a fim de direcionar o fluxo energético.
Estar atento à seriedade do brincar de uma criança é nosso objetivo e isto significa o reencontro com o seu prazer, e uma forma de descarregar culpas, medos, ansiedades e emoções. Esse é também um ato educativo, pois a educação não se reduz à transmissão de um certo conhecimento, mas pressupõe encontro onde o transmitido baseia-se no saber existencial, o qual é vinculador de ideais de ordem imaginária. Nosso propósito consiste na utilização de brinquedos com finalidades pedagógicas e profiláticas, para promover a evolução da criança.."
Brasilda Rocha é Supervisora da Clínica na área de Psicoterapia Corporal comcrianças e adolescentes, e na área de orientação familiar, coordenadora Geral do Núcleode cursos para formação de psicoterapeutas de crianças e adolescentes. É autora dos livros "Brinkando com o Corpo" e "Brinkando na escola". Software Brinky de Gestão de Clínica de Psicologia.
Fonte:
INFORMATIVO DO PROGRAMA DE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA "QUEM QUER BRINCAR?"
Ano VI, n. 75 – 28 de agosto de 2008.
FACULDADE DE EDUCAÇÃO - UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
- Exposição virtual de Fotografias "A Cidade das Crianças"

As fotografias apresentadas nesta exposição foram realizadas pelas crianças participantes do projeto Cidade das Crianças durante atividades do projeto nos anos de 2007 e 2008.

O caminho para a visita é http://www.culturainfancia.com.br/ - Portalzinho - Exposições A Cidade das Crianças.

A Cidade das Crianças tem como horizonte os olhares das crianças sobre a cidade de Porto Alegre. Atividades artísticas e lúdicas são o eixo do trabalho, incluindo teatro de sombras, desenhos, narrativas, sons, músicas, fotografias, brinquedos, brincadeiras tradicionais, histórias, literatura, passeios e visitas a locais históricos e culturais da cidade.

O Projeto Monumenta, Fundarte e Bamboletras são apoiadores do projeto.

A participação nas atividades supõe a doação mensal de um livro que será doado ao acervo da biblioteca do Centro Cultural CEEE Erico Verissimo, tendo como eixo temático a cidade e a infância em Porto Alegre e no estado do RS.

As atividades são realizadas semanalmente, aos sábados, das 15h30min às 17h30min no CCCEV - Rua dos Andradas, 1223, Centro, Porto Alegre.

Maiores informações:E-mail: ammeira@portoweb.com.br.
- Curso de Extensão Formação de Brinquedista

Dias: 05, 06, 12, 13, 26 e 27 de setembro e 03 de outubro.

Apoio:ULBRA Gravataí – Cursos de Matemática e Psicologia


Maiores informações: Brinquedoteca Aprender Brincando

Avenida Itacolomi, 360. Bairro São Vicente – Gravataí/RSFone: (51) 3431.76.77

E-mail: brinquedoteca@gravatai.ulbra.tche.br
- II Seminário Internacional de Educação Infantil: A Infância de 0 a 10 anos.

Participações de Gilles Brougère e Julio Romero.

Dias: 13 e 14 de setembro

Local: Rua Marquês de Abrantes 55, Flamengo. Rio de Janeiro


Promoção: Senac RioMaiores informações: Fone (21) 4002-2002

Site: www.rj.senac.br/ead/seminarioinfantil
- O NEPEEI - Núcleo de Pesquisa e Extensão em Escolarização Inicial da Faculdade de Educação da UFRGS promove o curso "Redimensionar as Práticas Pedagógicas na Escolarização Inicial".


Dias: de 01 a 25 de setembro (segundas, terças e quintas-feiras)

Horário: 19h às 22hLocal: sala 101 da FACED/UFRGS (Av. Paulo Gama, 110, Campus Centro).

O curso totalizará 40h aula.

O valor da inscrição é de R$ 40,00.

Maiores informações: Site: http://www.ufrgs.br/faced/extensao/nepeei

E-mail nepeei@gmail.com

Fone: (51) 3308.4154
II Seminário Caminhos da Infância: ‘Primeiros passos - cuidados integrais das crianças de 0 a 3 anos’.

Não violência desde o berço

Dias: 19, 20 e 21 de Novembro de 2008

Local: SESC Pinheiros. São Paulo

Maiores informações:Aliança pela Infância
Av. Tomás de Sousa, 552 – Jd. Monte Azul – 05836-350 – São Paulo – SP – BrasilFone: (11) 5851-5370 E-mail: alianca@aliancapelainfancia.org.br

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

terça-feira, 19 de agosto de 2008

A Associação Riograndense de Artes PLásticas Francisco Lisboa - Chico Lisboa convida as Escolas da Rede Municipal de Educação para visitarem a
exposição TERCEIRA IMAGEM,
da artista plástica Beth Gloeden
no Espaço Cultural Chico Lisboa
cuja abertura ocorrerá dia 23 de agosto,
às 10h.
A visitação com o acompanhamento da artista poderá ser realizada de 25 de agosto a 03 de outubro, de segunda a sexta-feira, das 14h às 18h, à exceção dos dias 04, 18, 24 e 25 de Setembro.
O horário de visitação deve ser agendado através do telefone da Associação Chico Lisboa: 3224-6678. Departamento CulturalChico Lisboa.

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Southern Gothic, 2001.
Maggie Taylor

quinta-feira, 14 de agosto de 2008



MoLDA, COlorE


MiStUra, brinca,


Cria A- maSSA


Vivemos na época da hiper-visualidade

Em um dos seus poemas, Affonso Romano de Sant’Anna diz que não está nada fácil ser poeta nestes dias, no entanto, demonstra-se incansável: contempla, faz, do cotidiano, poesia; trabalha, insere a poesia no cotidiano. Autor de poemas que marcaram época, como Que país é este?, Affonso Romano reuniu poetas em plena ditadura – na Expoesia-PUC/RJ; criou a revista Poesia Sempre; produziu poemas para rádio, televisão e jornais; instituiu o Sistema Nacional de Bibliotecas e o PROLER (Programa de Promoção de Leitura), demonstrando que, como já disseram, tem a capacidade de fazer, da palavra, ação. Nesta entrevista concedida por e-mail à Presente!, o poeta, professor, cronista, ensaísta, enfim, um artista que rompe muralhas, versa sobre a superficialidade da cultura contemporânea, o embrutecimento dos sentidos, o imperativo do homem em “aprender a ler o mundo” e, como um autêntico criador de metáforas, instiga-nos a exercitar o “terceiro olhar”.

Presente! – O título do seu livro – A cegueira e o saber – parece andar na contramão de conceitos estabelecidos, já que o conhecimento normalmente é associado à possibilidade de ver mais, à ampliação do olhar... É esse o objetivo?
Affonso Romano – Os seis primeiros textos do livro explicam isso. Recorro a uma série de mitos, de Édipo a textos mais atuais como o de Saramago, Ensaio sobre a cegueira, para explicar o que se passa com a chamada cultura contemporânea. Um dos nossos problemas é que vivemos na época da hiper-visualidade – TV, anúncios, Big Brother, mistura da vida privada com a pública, escândalos políticos, eróticos, “Caras”, culto às celibridades, - no entanto , nessa época do visual, estamos cegos. Daí a epígrafe que uso: “Somos em verdade uma raça de cegos e a geração seguinte, cega à sua própria cegueira, se assombrará com a nossa” (L.L. White).

Presente – É a própria hipervisualidade que provoca a cegueira?
Affonso Romano – Ela é o sintoma de algo. Ela não vem sozinha. Há um conjunto de fatores que estão embrutescendo os sentidos, poluindo a audição e os demais sentidos. A cultura contemporânea empurra tudo para a superficialidade, para o mercado, para a aparência, para o brilho fácil, o lucro imediato. Finalmente a sociedade de consumo conseguiu sua glorificação: o que interssa é a quantidade. Qualquer jovem quer ser “celebridade”. Os artistas se improvisam, porque decretou-se (equivocadamente) que qualquer um pode ser artista. O que é uma falácia da modernidade.
Presente! – Parece que mais importante que ver é ser visto. Concorda?
Affonso Romano – De fato. A cultura das “celebridades” (isso é insuportável) e da aparência leva àquilo que também examino neste livro e que interessou a tantos professores – a geração “tipo assim”, que é essa garotada entre 12 e 18 anos que sai para a night e não tem pouso fixo (sempre o deslizamento de significados), fica zanzando nos postos de gasolina ou de danceteria em danceteria e disputa quem vai beijar mais gente numa noite. Os garotos e garotas beijam 15, 20 pessoas, como se fosse uma olimpíada. E, quando beijam, estão olhando para a próxima pessoa a ser beijada. Querem ser vistos beijando. Isto é um sintoma analisado já por duas sociólogas (Noites Nômades – Ed. Rocco, de Maria Isabel Mendes de Almeida e Kátia Maria de Almeida Tracy). No mais está todo mundo querendo ser manequim e artista global. Triste.

Presente! – Como nós, humanos, enxergamos?
Affonso Romano – Há que aprender a “des-ver” e “re-ver”, enfim, pôr em função o “terceiro olhar”. Ser um excêntrico no sentido epistemológico do termo. Sair da manada. Assumir o seu discurso, a sua linguagem e não a linguagem ou ideologia da moda. A atual cultura contemporânea, em grande parte, está interessada na aparência. E a aparência é apenas parte de um todo, não a totalidade. Acresce que a ideologia que enfatiza o “fake” a “apropriação”, “ o pastiche”, cria uma armadilha para si mesma. É como narciso apaixonado pelo reflexo, pelo falso eu. O artista autêntico vai além disso, supera esses “sintomas” de época.

Presente! – porque o Senhor diz que “ver é uma ousadia”?
Affonso Romano – Ver, por outro lado, é sempre arriscado. Veja todos os mitos referidos em A cegueira e o saber. Aquele que denuncia o embuste, o que diz que o rei está nu, o que não pactua com a cegueira geral, corre o risco de ser expulso da corte. Aliás, não é de hoje que expulsam o poeta da república. Foi assim desde Platão. Neste meu livro cito até uma epígrafe, na fala de Milan Kundera e Zygmund Bauman, que repõe a questão em termos modernos. Milan Kundera comenta : “Escrever significa para o poeta romper a muralha atrás da qual se esconde alguma coisa que sempre esteve lá (...) Para elevar-se a essa missão, o poeta deve recusar servir verdades conhecidas de antemão e bem usadas, verdades já óbvias, porque trazidas à superfície e aí deixadas a flutuar. Não importa que essas verdades “supostas de antemão” sejam classificadas como revolucionárias ou dissidentes, cristãs ou atéias – ou quão corretas e apropriadas, nobres e justas sejam ou tenham sido proclamadas. Qualquer que seja sua dominação, essas ‘verdades’ não são as ‘coisas ocultas’ que o poeta é chamado a desvelar; são antes parte da muralha que é missão do poeta destruir”.
Presente! – Se estamos cegos, o que fazer para enxergar?
Affonso Romano – Não é fácil. Quem tem olhos veja, diz a Escritura. É preciso aprender a ler o mundo, decompor os sinais, entender o sentido (ou múltiplos sentidos). De algum modo, a maioria hoje é composta de “analfabetos funcionais”. Não lêem. Ao contrário, são lidos pelos acontecimentos, são objetos passivos, mas deveriam ser sujeitos da sua própria história. Em a cegueira e o saber falo da versão que Alberto Moravia oferece para aquele episódio na Odisséia em que Circe teria convertido os marinheiros de Ulisses em porcos. Não, os marinheiros se converteram em porcos espontânea e alegremente. Se chafurdavam alegremente. Isso se parece muito com as pessoas que vivem fazendo a apologia do “mal-estar da civilização”.
Presente! – O que vem a ser essa apologia do mal-estar da civilização?
Affonso Romano – Quando analisei, em Desconstruir Duchamp, a arte contemporânea, falando do amor que essa arte tinha pelo sujo, pela coprofilia, pelo caos, pelo grotesco e mórbido, teve gente que veio dizer que era isso mesmo, que a arte tinha que causar mal-estar. Olha, isso não tem nada a ver com arte. Se a pessoa é masoquista, deve se tratar. Arte não tem que provocar mal-estar nem bem-estar. Arte vai além disso, embora possa até causar uma outra coisa. Dizer que a arte tem que “agredir os burgueses” é coisa do século passado. Já deveríamos ter superado essa concepção. Arte é mais que insulto. Ela transcende sempre o presente.
Presente! – A arte oferece oportunidade de ver melhor?
Affonso Romano – Posso usar uma metáfora conhecida: A arte é a janela da alma. Aquela coisa que o Paul Klee dizia, que arte não reproduz, mas torna as coisas visíveis; não fala sobre a realidade, mas é uma realidade a mais. Você não vê o mundo da mesma maneira depois de tê-lo visto pelos olhos de Chagal ou Van Gogh, nem depois de ter lido Kafka ou Clarice.
Presente! – Qual a relevância do estético no cotidiano das pessoas?
Affonso Romano – Queiram ou não, os indivíduos fazem opções estéticas. Fato cristalinamente percebido nas comunidades primitivas – na maneira como fazem desenhos sobre o corpo, como escolhem adereços, como bordam ou fazem cestos. Na sociedade industrial, através de um processo de massificação, surgiu o kitsh, que não deixa de ser uma opção estética. Quando a gente vai namorar alguém, há uma série de exigências estéticas conscientes e inconscientes, que entram em jogo. O modo de arrumarmos nossa mesa, de dispormos os pratos para o jantar, de escolhermos flores, ou até mesmo o corte do pêlo de nosso cachorrinho, tudo passa pela estética.

Presente! – O que importa na experiência estética?
Affonso Romano – Várias coisas.Uma delas é a sensação de que a obra está lhe dizendo alguma coisa preciosa, única, que só ela pode dizer. Diferentemente do produto industrial ou da moda, que apela sobretudo para a quantidade, a arte que leva a estética em conta emociona, espanta, ensina , apazigua, inquieta, enfim, introduz uma perturbação que agrega algo ao seu cotidiano e a sua vida. Há uma coisa na estética, por outro lado, que nenhuma outra disciplina ou saber pode fornecer. E aí é que acontece a arte. Eu diria que há qualquer coisa de epifania (revelação) nisto. Aliás, como demonstrei em alguns ensaios, a obra de Clarice Lispector gira essencialmente em torno dos movimentos de epifania, que seus personagens vão tendo em suas vidas.
Presente! – Diante de tantas outras carências, há quem questione a importância da arte, da poesia, no cotidiano das pessoas. Se me permite, quero devolver-lhe a pergunta que consta na crônica Jardim também é cultura: “Estamos em pleno clima da “fome zero” e o senhor vem falar de jardins?
Affonso Romano – Quando estava visitando a região do Loire, na França, e tive a sorte de me hospedar no castelo de uma poeta amiga, Nicole Catrice, percorri os belos jardins em torno dos palácios da região. Mais uma vez confirmei coisas que havia assinalado quando estudei o urbanismo e os jardins em Barroco, do quadrado à elipse. O jardim é a nossa intervenção na natureza, na massa bruta. Ademais, tenho até um poeminha que talvez tenha a ver com isso: JARDIM
Meu conceito de jardim
Determina
O que é praga
Ao redor de mim


Presente! – Não está nada fácil ser poeta nestes dias, não é mesmo?
Affonso Romano – Nunca foi. Desde Platão que os poetas verdadeiros são expulsos da república. O intelectual mais exigente consigo mesmo é um excêntrico, um contestador nato. Ou contesta explicitamente ou contesta pela sintaxe, pela invenção. Quem procura a glória rápido, não deve investir em poesia. Ser poeta é escolher o caminho das pedras ou, como diz a Bíblia, escolher a “porta estreita, porque larga é a porta que conduz à perdição”.

Presente! – É possível ensinar a aprender e aguçar os sentidos, a exercitar o terceiro olhar?
Affonso Romano – Sim, veja o texto onde relato a “sensibilização poética” que fiz com alunos de um curso de criação literária na Espanha, fazendo com que descobrissem a poesia no dia-a-dia, seja na fala de alguém, num anúncio, num fato de rua ou de televisão. Temos que desentupir os sentidos, porque a obstrução acontece com os outros sentidos também. Por exemplo, a maioria das pessoas come mal e não sabe que come mal. Estão desperdiçando as sutilezas do paladar. O mesmo ocorre com a audição. Quanto ao olhar, é aquilo que já foi dito: temos que aprender a ler o mundo.
Presente! – Mais do que uma “Pedagogia do olhar”, o senhor está sugerindo uma “Pedagogia dos sentidos”?
Affonso Romano – Claro. Nessa direção, os estudados Levi-Strauss sobre os mitos são extraordinários. Eles mostram como os heróis das sagas são tão mais bem-sucedidos quanto mais abrem os sentidos para decodificar mensagens de perigo em torno de seus passos. Fechamento é morte; abertura é vida.
Presente! – Além, de artistas e escritores como Van Gogh, Clarice e Borges, que nos ensinam a ver, também os professores podem provocar essa “abertura dos sentidos”?
Affonso Romano – Tenho uma crônica usada em vários cursos de pedagogia e lida em formaturas, Desaprendendo a Lição, que trata disso. Roland Barthes havia dito que há uma época em que o professor ensina o que sabe, mas chega outra época em que ensina o que não sabe. Aí é que o curso fica bom.
Presente! – Se (...) só se pode galgar com os pés na poesia, peço pra finalizar esta entrevista, que complete a seguinte frase: Só se pode enxergar...
Affonso Romano - A poesia é uma das estratégias de conhecimento. No outro extremo está a ciência, que é irmã gêmea da poesia. Sou fascinado por livros de ciência que consigo entender. O artista produz metáforas, símbolos. O cientista, fórmulas e modelos. E todos manifestam o pasmo diante do universo.
Por Zulmar Aurélio (maio de 2007)- Revista Presente!

Postado por Bento.

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Educação Infantil na Fundação Iberê Camargo

Estes são alguns dos meus alunos em uma de nossas saídas à Fundação Iberê Camargo.
As crianças estavam encantadas com as janelas da Fundação! (só as crianças?)
“As bicicletas de Belleville”, dirigido pelo francês Sylvain Chomet.
''Acho que o quintal onde a gente brincou é maior do que a cidade. A gente só descobre isso depois de grande. A gente descobre que o tamanho das coisas há que ser medido pela intimidade que temos com as coisas. Há de ser como acontece com o amor. Assim, as pedrinhas do nosso quintal são sempre maiores do que as outras pedras do mundo. Justo pelo motivo da intimidade. (...) Se a gente cavar um buraco ao pé da goiabeira do quintal, lá estará um guri ensaiando subir na goiabeira. Se a gente cavar um buraco ao pé do galinheiro, lá estará um guri tentando agarrar no rabo de uma lagartixa. Sou hoje um caçador de achadouros da infância. Vou meio dementado e enxada às costas cavar no meu quintal vestígios dos meninos que fomos (...).''

Manoel de Barros

terça-feira, 12 de agosto de 2008

O Balão Vermelho
(Le Ballon Rouge, França, 1956)

Infância

E volta sempre a infância
com suas íntimas, fundas amarguras.
Oh! por que não esquecer
as amarguras
e somente lembrar o que foi suave
ao nosso coração de seis anos?

A misteriosa infância
ficou naquele quarto em desordem,
nos soluços de nossa mãe
junto ao leito onde arqueja uma criança;

nos sobrecenhos de nosso pai
examinando o termomêtro: a febre subiu;
e no beijo de despedida à irmãzinha
à hora mais fria da madrugada.

A infância melancólica
ficou naqueles longos dias iguais,
a olhar o rio no quintal horas inteiras,
a ouvir o gemido dos bambus verde-negros
em luta sempre contra as ventanias!

A infância inquieta
ficou no medo da noite
quando a lamparina vacilava mortiça
e ao derredor tudo crescia escuro, escuro...

A menininha ríspida
nunca disse a ninguém que tinha medo,
porém Deus sabe como seu coração batia no escuro,
Deus sabe como seu coração ficou para sempre diante da vida
— batendo, batendo assombrado!


Henriqueta Lisboa