quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Notas para uma pedagogia visual bem humorada

  1. É natural que utilizemos obras de arte para o exercício de nossa desconfiança. Cultivar suspeitas pode nos salvar de verdades.
  2. Não se deixe enganar por tentativas de explicação de obras de arte; na maioria dos casos elas são desmentidas pelas próprias obras.
  3. Não confie na autonomia "soberana" das obras de arte, pois elas dependem do desconhecido que as tornou possíveis.
  4. Acredite nas dúvidas, especialmente naquelas sugeridas pelas obras; algumas delas são necessárias para a superação de nossas limitações.
  5. procure ver somente o necessário. A quantidade indiscriminada das coisa visíveis pode reduzir, em muito, a qualidade das experiências.
  6. Não espere ver o que esperava ver antes de conhecer. Só as obras de arte de qualidade duvidosa atendem a essa expectativa.
  7. Não confiem em artistas que parecem querer chamar sua atenção com artimanhas e "técnicas mirabolantes". estes bajuladores de público estão interessados apenas em mídia.
  8. Se um objeto artístico não parece ser arte, não o discrimine automaticamente. Só os falsificadores estão preocupados em fazer algo que se "pareça com arte". Artistas, por outro lado, fazem somente o que acreditam que deve ser feito.
  9. Considere sobretudo o "teor de evidência" de um objeto. Por mais completa que uma obra de arte possa parecer, ela será sempre insuficiente em relação àquilo que desconhecemos. Se for uma obra prima superará até mesmo o desconhecido.
  10. A espontaneidade não é um valor. É uma partida ou uma chegada. A simplicidade ou a complexidade ocorrerão apesar dela.
  11. Não pergunte o que os artistas querem dizer com as suas obras. Pergunte às obras. Ou encontre a satisfação nos riscos que estimulam sua curiosidade.
  12. A trancedência e o sorriso são invenções humanas. Um outro lado do ar é a contribuição dos artistas.
Waltércio Caldas

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Eras

Antes a gente falava: faz de conta que
este sapo é pedra.
E o sapo eras.
Faz de conta que o menino é um tatu.
E o menino eras um tatu.
A gente agora parou de fazer comunhão de
pessoas com bicho, de entes com coisas.
A gente hoje faz imagens.
Tipo assim:
Encostado na Porta da Tarde estava um
caramujo.
Estavas um caramujo – disse o menino.
Porque a Tarde é oca e não pode ter porta.
A porta eras.
Então é tudo faz de conta como antes?

(Barros, 2001.)